Escolher a escola dos filhos não é tarefa fácil, não é? Projeto pedagógico, área física, estrutura, corpo docente... São inúmeras variáveis nessa seleção. O que levar em conta nesse momento? E mais: depois de feita a matrícula, até que ponto podemos interferir no trabalho dos educadores? 

Para o educador e escritor Alexandre Le Voci Sayad, sócio-fundador da ZeitGeist - Educação, Cultura e Mídia e membro do conselho da aliança GAPMIL, da UNESCO internacional, uma relação mais saudável entre pais e escola passa por confiança mútua e por um esforço em prol do maior  beneficiado dessa história toda: o aluno. Vem ver!


Primi Stili - Muitos pais defendem que a família pode e deve intervir na escola o quanto quiser - porque a "base" da educação vem da família. Como se daria, na sua opinião, uma convivência ideal e saudável entre família e escola?  

Sayad - Escolher uma escola é confiar a educação dos filhos a uma linha de pensamento - e de prática. É um pouco cruel, sob alguns aspectos, porque a tangibilidade do aprender ou não é imediata, tampouco pré-definida. Educação é um processo. Nessa escolha, confiança na escola é o papel principal.
Por outro lado, a  escola deve desenvolver um programa de participação para pais muito além das cansativas reuniões de pais e mestres que sempre acabam em discussão. Esse é um modelo que não funciona mais.
Pais e escola devem entender que fazem parte de uma rede de formação dos alunos, que inclui a mídia, os amigos, a arte, os games e por aí vai. Cada qual coloca limites e campo de ação. Os pais devem entender que na rede de aprendizado em que os filhos estão, o papel da família é crucial em aspectos complementares ao da escola.
Pai não muda metodologia ou regra de escola. Essa atitude viola o próprio princípio de autonomia e limites com relação ao filho. Isso é soberano da escola. Mas a família deve sim criar estratégias que auxiliem o filho a melhorar o desempenho, atentar junto a orientadores da escola com relação ao bullying e outras práticas, por exemplo.

PS - Quais os aspectos mais importantes que os pais devem levar em conta na hora de escolher uma escola cujo perfil se adeque às crenças da própria família?

Sayad - Não só às crenças da família, mas ao perfil do aluno. Há escolas que até hoje tratam muito mal as Humanidades, em outras as Exatas são deixadas em segundo plano. Há escolas que trabalham por projeto, outras conteudistas focam no vestibular. O que pais e filhos esperam vivenciar? Qual o projeto de vida, cada etapa dele? Essa é a pergunta a ser respondida. O filho também deve ter voz ativa.
Há três esferas de decisão: 1) Que escola eu enquanto mãe ou pai me identifico mais? 2) Como essa escola se relaciona às mudanças na sociedade e no mundo hoje? 3) Que escola mais se encaixa com os projetos de estudo e aptidões do meu filho? Eu o conheço bem?

PS - É essencial que a escola compartilhe das mesmas crenças (especialmente as relativas à educação) da família? 

Sayad - Sim. Isso é fundamental nessa relação complementar e cooperativa. Diria que é o primeiro passo para a relação ser bem sucedida. Esse é o campo da questão moral que, ao meu ver, é mais um dever familiar hoje - a escola dá continuidade a isso. A escola tem que dar conta do desenvolvimento social, cognitivo, sócio-emocional do aluno em parceria com a família.

PS - De que forma os pais podem ser parceiros da escola em vez de apenas intervirem quando há algo de que discordam? 

Sayad - Encontrar canais de interlocução que não prejudique ou tutore em excesso o desenvolvimento do filho, sua autonomia e vida escolar. Escola foi feira para os educandos. A preocupação com ele deve estar sempre em primeiro plano. As instituições devem ser criativas nesses canais de interlocução. Há projetos, muitos deles a ZeitGeist, minha empresa, encabeça, que usa da tecnologia para criar um canal não só com orientadores, mas também com as novidades do mundo da educação adotadas por determinada instituição que são desconhecidas pelo pai - que estudou geralmente em um outro modelo de educação. A escola pode, mas poucas fazem, exercer o papel de atualizar os pais em metodologias e tendências. É um outras maneira de aproximar pais e trazê-los para preocupações contemporâneas.

PS - Qual o limite da intervenção dos pais na escola? 

Sayad - Vivemos uma era de excesso de tutoria. Por isso, acho que quem deve dar o limite é a própria instituição. Por isso a necessidade de se reinventar as possibilidades de troca para além das reuniões de pais e mestres. Abrir outras frentes por meio da tecnologia é a solução que vislumbro e aplico. Grupos de Whatsapp são mais provocadores de notícias falsas e disseminadores de fofocas do que construtores de soluções. Mas há escolas que usam de outros aplicativos para facilitar essa relação. Ou promovem rodas de diálogo com temas contemporâneos.

PS - Como a escola deve se posicionar diante da intervenção dos pais e como ela pode nutrir uma relação de cooperação entre família e escola?

Sayad -  Inovando na forma e conteúdo relacionados a essa relação. É uma área carente de inovação. Pais precisam de entrada qualificada nas escolas a acho que esse primeiro passo deve ser das instituições, abrindo pequenas portas. E mostrando caminhos de fato educativos para todos os atores.

O educador participou da Roda de Encontros da Matutaí, que se realiza mensalmente na Livraria da Vila, em São Paulo. O projeto tem o propósito de inspirar e transformar, e foram pensados para mães e pais interessados em refletir sobre a educação informal e as relações afetivas, principalmente com os filhos, por meio de conversas com profissionais sensíveis, autênticos e talentosos. Clique aqui para acessar o site de venda de ingressos para os encontros.

Veja a agenda dos próximos encontros e participe:

10/10: "O cultivo dos vínculos familiares"

Lucia Rosenberg: Psicóloga psicoterapeuta, palestrante do TEDx SP e professora na Casa do Saber. A conversa com a Lucia carrega cada um de nós de volta para casa, para o colo da mãe, para os almoços em família. Tem cheiro de bolo quente em dia de aniversário. O amor familiar, para ela, não nasce pronto. Ele cresce junto com as marcas e os marcos, os medos, os risos, as brigas e as conquistas que a gente cultiva todos os dias. 

7/11: "A luta diária de educar"

José Bueno: Arquiteto e urbanista, mestre em Aikido e convidado especial em projeto de formação de lideranças da Amana-Key por mais de 10 anos. O melhor papel de Bueno, segundo ele mesmo, é o de faixa preta em criar pontes. Com essa metáfora, ele promove suas buscas por formas colaborativas de interação entre as pessoas, principalmente fora do tatame. Essa será uma oportunidade de seguir seus passos de mestre, numa travessia que pode aproximar pais e filhos, estabelecendo, nessa relação, uma coreografia mais harmoniosa, com menos embates e mais encontros positivos, construtivos e reveladores.

5/12: "A relação entre pai e mãe e sua influência sobre os filhos"

Luiz Alberto Hanns: Administrador de empresas, psicólogo de casais e especialista em orientação para pais, autor dos livros “A equação do casamento” e “A arte de dar limites”. O casamento, na compreensão de Hanns, deixou de ser uma "missão", para tornar-se um projeto prazeroso. Os desafios dessa nova instituição trazem angústias que podem atingir toda a família. Esse encontro vai discutir aspectos que podem acolher questões decorrentes das expectativas dessa relação.